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quinta-feira, 24 de março de 2011

Na luta contra alienação humana

Na Luta Contra a Alienação Humana
Sou de uma geração que entendeu mal o sentido da palavra alienação. Dizia-se nas rodas de discussão que a pessoa alienada era aquela que estava por fora das questões políticas, que não participava, enfim, da vida política. Na verdade, o conceito de alienação formulado por Marx já em 1844 nada tem a ver com esta concepção vulgar que a gente cultuava - e que aliás a "esquerda" mundial cultua até hoje. Alienação está ligada à inconsciência das pessoas de sua atividade, de sua práxis, das relações que elas estabelecem entre si e com a natureza. E da transferência para outrem de sua própria vontade. E é isto o que observamos de forma quase generalizada no mundo regido pelo capitalismo.

Como se sabe, no capitalismo as relações entre as pessoas são mediadas pelo valor-dinheiro, ou seja, por algo externo, que é fruto do "trabalho" humano mas que torna-se autônomo com relação ao seu criador. O dinheiro, portanto, é a expressão de um trabalho abstrato, morto, encarnado nas mercadorias, que ganha vida própria e submete a própria vida do homem à sua lógica de autoreprodução e revalorização permanente. O ser humano não importa - o que importa é ganhar mais e mais dinheiro, como um fim em si mesmo - ou então trabalhar mais e mais, considerando que o trabalho "produtivo" é a fonte de mais dinheiro. O trabalho, neste caso, perde o seu conteúdo sensível e torna-se uma abstração, uma atividade voltada não para a realização do homem mas para a realização de mais dinheiro. A velha frase - "o trabalho dignifica o homem" - não passa de uma ideologia vazia e reforçadora da lei automática do dinheiro, já que só se considera "trabalho" aquele voltado para a revalorização de dinheiro e não qualquer atividade humana. O índio é visto como um "preguiçoso" porque não produz para um mercado, embora realize o necessário para sua sobrevivência. O modelo ideal de uma sociedade frustrada como a nossa é o daquele sujeito que "trabalha" de 10 a 14 horas por dia fazendo aquilo que não gosta mas "ganhando dinheiro". O que só pode gerar pessoas infelizes, neuróticas e cada vez menos humanas e mais robotizadas ou estúpidas.

Uma sociedade assim é uma sociedade alienada pois não tem controle direto daquilo que faz e obviamente não sabe porquê faz, nem como, nem para quem faz. Produz-se para um sujeito chamado "mercado" ao invés de produzir para a satisfação geral da humanidade. Produz-se armas ao invés de comida pois as guerras plantadas são mais lucrativas. Destrói-se o próprio meio ambiente no qual se habita em nome de um lucro imediato e egoísta. Não admira portanto que todas as esferas desta forma social atual sejam marcadas pela alienação. A democracia e a política, por exemplo, são a expressão mais clara desta alienação. Uma sociedade que tivesse o controle direto e consciente daquilo que faz, de forma solidária, não precisaria sequer de política ou de políticos. Administraria tudo em forma de autogestão solidária. Esta especialização e separação entre povo e políticos (ou política) é a cara da alienação. A impressão superficial é a de que os povos são tratados como se fôssem menores de idade e tivessem que eleger "representantes" para decidirem as coisas por eles. Trata-se de uma verdade pela metade pois a própria política, como algo externo à sociedade, não tem controle sobre os mecanismos de reprodução do capital.

Política e políticos e esta forma de democracia não são uma aberração porque estão separados e distanciados do povo; aberração maior é esta forma de existência social em si, alienada, que produz entidades e organismos externos, alheios ao controle direto das pessoas - à semelhança da própria vida cotidiana dos indivíduos alienados. É estupidez, portanto, querer "corrigir", por dentro do sistema, as formas acabadas que lhe são inerentes. Ora, se as pessoas se submetem inconscientemente a uma mediação externa - no caso, o dinheiro; se são incapazes de manterem uma relação solidária, direta, consciente, com as demais pessoas e destas com a natureza; é mais do que natural que se submetam à formas alienadas, alheias ao seu controle, como é o caso da política e da democracia (ou ditadura, ocasionalmente) existente. Na verdade, a participação política chega a ser até mais reforçadora da alienação do que a não-participação. Pois os adeptos da negação geral à política, mesmo que sem consciência do seu protesto, podem ter mais sensibilidade para entender uma crítica fundamentada à alienação gerada pelo capital. O que é bem mais difícil sobretudo por parte da tradicional "esquerda" mundial, toda ela envolvida com a viciada prática deste jogo político que nada mais é do que a expressão de um sistema alienado.

A humanidade terá que superar esta fase pré-histórica - não no sentido pejorativo ao período considerado pela historiografia como "pré-histórico". A pré-história que acompanha o homem desde que tornou-se bípede e distinguiu-se das demais espécies animais, caracteriza-se pela inconsciência dos indivíduos com relação à sua própria existência - a sua submissão à uma "história de relações fetichistas" (A.Jappe). Caso algum dia consiga ultrapassar esta barreira, deixará para trás política, Estados nacionais, mercado, dinheiro, trabalho (enquanto atividade abstrata voltada para ganhar dinheiro), partidos políticos, sindicatos, enfim, todas estas formas históricas que caracterizam uma vida alienada e afastam o indivíduo de sua realização enquanto ser humano.
Euler Conrado – Contatos pelo E-mail: eulerc@vespanet.com.br

P.S. Não somos os primeiros, e felizmente nem os únicos, a pensar tais idéias. Por isto, na medida do possível, divulgaremos nesta página textos de colegas que têm, no essencial, a mesma perspectiva de luta. Divulgaremos também textos que já se tornaram patrimônio coletivo da humanidade, como as obras de Karl Marx, entre outras. Por último, divulgaremos links de páginas que, a exemplo desta, pretendem honestamente discutir alternativas à esta forma histórico-social. As críticas e contribuições teóricas daqueles que nos visitarem serão bem-vindas.


O capital cria os seus conflitos. Devemos dar direção a eles não como reformadores do mundo das mercadorias, mas como destruidores do mecanismo do valor (...) Devemos preparar e organizar movimentos de pessoas que foram e estão sendo esmagadas pelo mundo do capital. Nosso objetivo não será o de reempregá-los na produção e reprodução do valor, mas de resgatá-los na construção do novo sistema.
   As respostas imediatas à questão do Iraque estão no horizonte do valor, da política e da diplomacia. Mas, não se trata de respostas imediatas. É preciso perguntar, antes de responder sim ou não às questões imediatas que nos assaltam. E a pergunta fundamental é esta: é preciso dinheiro e capital para produzir a vida e a cultura? É preciso que haja produção de valor para usufruirmos os benefícios das descobertas tecnológicas e científicas e dos avanços culturais? Aqui a resposta coloca-se definitivamente no campo do sim ou do não.
O cinismo e a hipocrisia de uma sociedade que reluta em enxergar a si própria, só não superam a velocidade com que a lógica autodestruidora do capital se reproduz.
No mundo da modernidade, se a Cristandade (e mesmo o Judaísmo, entre seus irmãos) levasse ao pé da letra a máxima segundo a qual "tempo" é algo de Deus e portanto quem o vendesse ou comprasse estaria cometendo pecado mortal, não sobraria um só indivíduo na face da Terra que não tivesse a sua alma condenada pelo fogo de satã.
A esquerda mundial, com seus dogmas, mitos e rituais, tornou-se uma seita, cujo espaço de ação está garantido pela "democracia" de mercado. Cabe agora, aos que não desaprenderam a sonhar, a luta pelo (re)nascimento do ser humano, livre das relações fetichistas que tem caracterizado a sua (nossa) existência até os dias de hoje.
Tendo reduzido o problema da "crise" a um problema técnico, gerencial, resta apenas rezar para que algum governante super dotado apareça com um plano mágico e nos salve. Com a descanonização de FHC e Cia haverá sempre um novo candidato a apresentar uma saída espetacular para a crise nacional. Mas enquanto elites privilegiadas disputam as fatias de poder econômico e político, será necessário que a humanidade, caso deseje algum dia livrar-se desta prisão, comece a discutir sobre o que fazer para abreviar a existência do capital.
Se o Manifesto Comunista propunha ao proletariado que se unisse para assumir o poder, o Manifesto Contra o Trabalho, ao contrário, chama os trabalhadores para pôr um fim neste sistema, negando qualquer forma de poder e buscando construir uma sociedade sem fronteiras, sem política (enquanto prática especializada e separada da sociedade). Para que isto seja possível, novas relações deveriam ser construídas. As pessoas deixariam de produzir para o mercado e de viver em função da revalorização do dinheiro, que deixaria de existir. Em lugar disto, a sociedade, em forma de autogestão solidária, passaria a decidir conscientemente o quê, quando e como produzir, atendendo às necessidades coletivas e individuais.


Na modernidade, Estado e política são inseparavelmente ligados ao sistema coercitivo do trabalho e, por isso, precisam desaparecer junto com ele. O palavreado sobre um renascimento da política é apenas a tentativa de reduzir a crítica do terror econômico a uma ação positiva referente ao Estado. Auto-organização e autodeterminação, porém, são simplesmente o oposto exato de Estado e política. A conquista de espaços livres sócio-econômicos e culturais não se realiza no desvio político, na via oficial, nem no extravio, mas através da constituição de uma contra-sociedade.
Liberdade quer dizer não se deixar embutir pelo mercado, nem se deixar administrar pelo Estado, mas organizar as relações sociais sob direção própria – sem a interferência de aparelhos alienados. Neste sentido, interessa aos inimigos do trabalho encontrar novas formas de movimentos sociais e ocupar pontos estratégicos para a reprodução da vida, para além do trabalho. Trata-se de juntar as formas de uma práxis de oposição social, com a recusa ofensiva do trabalho.
Os poderes dominantes podem declarar-nos loucos porque arriscamos a ruptura com seu sistema coercitivo irracional. Não temos nada a perder senão a perspectiva da catástrofe para a qual eles nos conduzem. Temos a ganhar um mundo além do trabalho.
Proletários de todo mundo, ponham fim nisso!

Comentários e Críticas
Com o objetivo de ampliar a discussão em torno do Manifesto Contra o Trabalho, publicamos a seguir comentários e análises críticas deste documento. As diferentes conclusões que encontraremos nestes textos com certeza contribuirão para o debate que, entendemos, deve ser estabelecido entre aqueles que partilham o sonho comum de uma sociedade livre do capital. Este espaço está aberto portanto para novas contribuições, réplicas e tréplicas.




"Todos eles têm um mesmo desígnio, e entregarão sua força e seu poder à besta. E que só possa comprar ou vender quem tiver o sinal, a saber, o nome da besta ou o número do seu nome"
(livro Apocalipse - frase reproduzida por Marx em "O Capital", cap. II)

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"Uma relação social definida, estabelecida entre os homens, assume a forma fantasmagórica de uma relação entre coisas." (Marx)

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